quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Com azeite e com afeto

Há somente um lado correto para que se perfure uma lata de azeite de oliva. Embora rompesse o descansado almoço de feriado, a declaração não surpreendia. Irritava somente um tiquinho. Dita em brando tom, causava ligeiro incômodo por vir antecedida de impertinente interrogação.

- Quem abriu a lata desse jeito?

Ora, a possibilidade do ato não ter sido praticado por sua interlocutora era praticamente zero. Então por que ele utilizava-se de indagação retórica? O objetivo era criticar. Só podia. E a segunda indagação? Essa servia para enfatizar a incorreção do ato.

- Por que não foi aberto o bico dosador?

Mal pudera responder que o momento fora de pressa, por isso, impróprio para maiores cuidados na abertura do tal bico dosador da lata de azeite, a responsável por tamanho descuido doméstico recebeu a lição inspiradora desse texto:

- Perfurada desse lado, há que se curvar o punho para o suave derramamento do óleo no alimento que o aguarda. Veja: quando aberta desse outro lado - o correto -, apenas um leve inclinar da mão, sem precisar dobrá-la, já promove a colocação precisa do azeite.

Os meticulosos gestos do marido, virginiano, acompanhados de suas detalhadas e repetidas explicações, ilustravam com clareza à esposa, geminiana, a orientação a ser seguida.

- É claro que esse lado é ideal para os destros! Esse outro lado aqui seria adequado para os canhotos, recomendava o marido, que, ao depositar didaticamente o dedo indicador em uma terceira extremidade da lata, era interrompido pela franca inquisição da esposa, que - palavras masculinas ao longe – tentava imaginar conflitos alheios:

- Querido, sabia que o Pedro é geminiano e a Isa virginiana? O contrário de nós dois!

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