sábado, 26 de setembro de 2009

Gauchismo – parte I

Li em crônica de Ricardo Silvestrim frase que sintetiza minha aflição acerca do que é ser gaúcho. Na verdade, o cronista tocava em outro assunto. Em texto que recomendo (Jovens, adultos e velhos), criticava o nosso ensino de literatura por centrar-se no que é nacional e contemporâneo. Ocorreu, porém, que a frase de Silvestrin caiu como luva para o sentimento bairrista que tem sido alimentado em nossas bandas nos últimos tempos. Eis suas palavras: “A valorização do que é nosso distorce o nosso valor. Não nos vemos em relação aos outros. Só em relação a nós mesmos.”

Puxa vida, mas é exatamente isso que penso sobre o egocentrismo pampeano. Há muito incomodam-me certas manifestações rançosas nomeadas em frases como “orgulho do Rio Grande”, “ah, eu sou gaúcho”, além de gritos inflamados em shows em que o artista é aclamado gaúcho, como se essa fosse a maior expressão de reconhecimento. “Ucho, ucho, ucho, Roberto é gaúcho”. Bairrismo, provincianismo, separatismo. Os ismos são variados e seus tons, não bastassem o ridículo, por vezes, são assustadores pelo que representam de sectarismo.

Na semana passada, tempo de festa Farroupilha, ZH destinou espaço para o causo de um paulistano que andou se estranhando com certas gauchadas ofensivas. Funcionário público, há três anos morador de São Borja, Sandro Amoroso Pacheco afirmou em mídia local que seu principal objetivo é deixar o Rio Grande. A certeza de que alcançará o feito foi anunciada em uma frase engraçadíssima, que ZH chamou de desabafo: “Acredito que vou conseguir (deixar o RS), pois não há pena perpétua no Brasil”.

Pacheco ressaltou, porém, que aos seus conterrâneos falta essa “prova de amor” a sua terra. Evidentemente que o amor à própria terra é algo positivo, alimenta a auto-estima e faz com que o povo - forte, aguerrido e bravo - enfrente suas crises e ainda considere-se modelo a toda terra.

Contudo, é preciso que de fato nos vejamos em relação aos outros, que façamos isso de modo solidário, observando as qualidades alheias e reconhecendo nossas deficiências. O Rio Grande do Sul é, realmente, um Estado singular. É em nome de sua admirável singularidade que espero não vê-lo tornar-se um estado de gente arrogante!

Pois é... o assunto rende. Falarei mais a respeito em outra ocasião.

2 comentários:

  1. Simone, grande amiga, parabéns pelo blog e pelas idéias. Para variar, compartilhamos mais uma coisa: não aguento esses gauchismos! Li a crônica do paulista e concordei com ele em gênero e grau. Que mania que algumas pessoas dessa terra tem de achar que somos de uma estirpe superior... Infelizmente, acabo sempre relacionando esse "ranço" gauchesco com o velho nazismo. Quando li as declarações do paulista, lembrei na hora de uma crônica da Marta Medeiros em que ela externa sua total incredulidade com o estilo "pampa, meu país", principalmente quando vê esse espírito provinciano na juventude. Segundo ela "botaram alguma coisa na água do chimarrão da gurizada".
    Imagino que o pobre paulista deve estar andando com guarda-costas depois de externar seu descontentamento com a querência! Não deve ter faltado neste pago alguém que tenha sentenciado-lhe pena de morte!

    Um abraço,

    Inaiara

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  2. Oi, Si. Que saudade menina!! Adorei teu blog, em especial esse texto, que me fez pensar.. Daqui de Floripa, da India ou de London, nunca vou deixar de ser gaúcha mas é estranho como a gente reconhece fora dai que existem tantas coisas e olhares interessantes que esse gauchismo exacerbado não nos deixa ver, principalmenrte em relação a nossa própria terra...afinal, o que é ser gaúcho: é tomar chimarrão? é ser provicinciano ou preconceituoso? esse assunto rende..
    Bjos enormes na família
    Laura Coutinho (sempre com saudade de POA)

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